segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

Os Transparentes

Os Transparentes

Ondjaki

por Alexandra Azevedo

Luanda _ personagem central de “Os Transparentes”
“Os Transparentes” é um romance de amor a Luanda,  
A cidade é a personagem central  e objecto da paixão do autor que a ama em todas as suas facetas e contradições, numa paixão intensa como intensa e trágica é a imagem que surge  logo no primeiro capítulo,  de uma cidade em chamas, uma “cidade ensanguentada, desde as suas raízes ao alto dos prédios”(p. 13).
E justamente, há um prédio, com um rio no 1º andar (“…só faltam peixes e jacarés” dizia sempre em umbundu a “AvóKunjiquise p. 16),  prédio que é a personagem principal de “Os Transparentes”. e que lá em cima, (“lá em cima, na linguagem do prédio, era no terraço, lugar aberto e desarrumado,”p. 51),  permitia ver a cidade “sem o peso doloroso dos seus problemas e dos seus dramas”(p. 53).O que é bonito nesta cidade, Odonato…são as pessoas, as festas, o ritmo, até os enterros”(p. 53) É o amor de Ondjaki a Luanda que se sente nas palavras  de Xilisbaba, mas o autor sabe que é só dali de cima  que a cidade é mais simples. E ele não quer iludir a realidade: “_ passámos muitos anos Xilisbaba, em busca do que é bonito para suportarmos o que é feio. E não estou a falar dos prédios, dos buracos na estrada, dos canos rebentados. Já é hora de encararmos o que não está bem” (p 53)
E o que não está bem e o autor denuncia, é a luta pela sobrevivência numa sociedade profundamente desigual e injusta. O que não está bem é a corrupção que percorre todo o tecido social, os negócios tenebrosos dos poderosos, a demagogia , a prepotência. O que não está bem é a falta de liberdade que leva ao desânimo os mais lúcidos. O que não está bem é a fome que faz o povo transparente. “E o povo é transparente? (…) não. não é todo o povo. há alguns que são transparentes. (p. 284)
E esses são squeles  que não têm jeito para esquemas, que estão fartos de comer de mão amiga, que  querem comer com o fruto do seu trabalho, da sua profissão, aqueles que deixaram de sentir a fome, que se habituaram à miséria, aqueles que desistiram. Esses são os transparentes. _ Tive dores no início, fome, dor de estômago, mas por alguma razão tive o instinto de não comer mais, era uma espécie de desistência, mas não lhe posso explicar muito porque não era um pensamento pensado. foi sendo… foi sendo. E a dada altura deixei de sentir fome (p. 283) “Acho que a cidade fala pelo meu corpo.”(p. 284)-
E essa cidade que fala pelo corpo de Odonato é uma cidade ensanguentada e forçada inclinar-se para a morte (p. 13) por força da ganância de alguns.
Por isso,
Já é hora de encararmos o que não está bem.

  8 de Outubro de 2017

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