Os Transparentes
Ondjaki
por Alexandra Azevedo
Luanda _ personagem central de “Os Transparentes”
“Os
Transparentes” é um romance de amor a Luanda,
A
cidade é a personagem central e objecto
da paixão do autor que a ama em todas as suas facetas e contradições, numa
paixão intensa como intensa e trágica é a imagem que surge logo no primeiro capítulo, de uma cidade em chamas, uma “cidade ensanguentada, desde as suas raízes
ao alto dos prédios”(p. 13).
E
justamente, há um prédio, com um rio no 1º andar (“…só faltam peixes e jacarés” dizia sempre em umbundu a “AvóKunjiquise p.
16), prédio que é a personagem principal
de “Os Transparentes”. e que lá em cima, (“lá
em cima, na linguagem do prédio, era no terraço, lugar aberto e desarrumado,”p.
51), permitia ver a cidade “sem o peso doloroso dos seus problemas e
dos seus dramas”(p. 53). “O que é
bonito nesta cidade, Odonato…são as pessoas, as festas, o ritmo, até os enterros”(p.
53) É o amor de Ondjaki a Luanda que se sente nas palavras de Xilisbaba, mas o autor sabe que é só dali
de cima que a cidade é mais simples. E ele não quer iludir a realidade: “_ passámos muitos anos Xilisbaba, em busca
do que é bonito para suportarmos o que é feio. E não estou a falar dos prédios,
dos buracos na estrada, dos canos rebentados. Já é hora de encararmos o que não
está bem” (p 53)
E
o que não está bem e o autor denuncia, é a luta pela sobrevivência numa
sociedade profundamente desigual e injusta. O que não está bem é a corrupção
que percorre todo o tecido social, os negócios tenebrosos dos poderosos, a
demagogia , a prepotência. O que não está bem é a falta de liberdade que leva
ao desânimo os mais lúcidos. O que não está bem é a fome que faz o povo
transparente. “E o povo é transparente? (…)
não. não é todo o povo. há alguns que são transparentes. (p. 284)
E
esses são squeles que não têm jeito para esquemas, que estão
fartos de comer de mão amiga, que querem
comer com o fruto do seu trabalho, da sua profissão, aqueles que deixaram
de sentir a fome, que se habituaram à miséria, aqueles que desistiram. Esses
são os transparentes. _ Tive dores no
início, fome, dor de estômago, mas por alguma razão tive o instinto de não
comer mais, era uma espécie de desistência, mas não lhe posso explicar muito
porque não era um pensamento pensado. foi sendo… foi sendo. E a dada altura
deixei de sentir fome (p. 283) “Acho
que a cidade fala pelo meu corpo.”(p. 284)-
E
essa cidade que fala pelo corpo de Odonato é
uma cidade ensanguentada e forçada inclinar-se para a morte (p. 13) por
força da ganância de alguns.
Por
isso,
Já é hora de encararmos o que não
está bem.
8 de Outubro de 2017
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