terça-feira, 1 de maio de 2018

Samarcanda





Clube de Leitura de 9 de abril de 2018


SAMARCANDA

Amin Maalouf


Verba volant, scripta manent

Temas de Reflexão



  • ·       As autoridades civis e religiosas da antiga Pérsia
  • ·        Omar Khayyam: a poesia e o poeta
  • ·       Samarcanda e Rota da Seda
  • ·       A história da Pérsia/Irão do século XX  
  • ·       Omar Khayyam vs Ricardo Reis
  • ·       Irão, impressões pessoais
  • ·       Samarcanda- a estrutura do romance
  • ·       O livre génio da Pérsia espartilhado no dogmatismo muçulmano
  • ·       “…se o Oriente não conseguir despertar, em breve o Ocidente não conseguirá dormir” (pág. 258)
  • ·       O mistério do manuscrito de Samarcanda



«Se o Oriente não conseguir despertar, em breve o Ocidente não conseguirá dormir»

                                                                  por Maria João Leite de Castro

A frase é de Howard C. Baskerville (séc. XIX/XX), na altura ainda estudante na Universidade de Princeton, Nova Jersey, mas já desejoso de partir para a Pérsia e de contribuir para esse despertar do Oriente.
Pouco tempo depois, será colocado em Tabriz como mestre escola e desenvolverá, não apenas a sua actividade como professor de inglês e ciências, mas sobretudo como activista e ideólogo de uma nova sociedade, de uma nova Pérsia, liberta da tirania do Xá e dos chefes religiosos. É em nome dessa ideia e da convicção de que é necessário resistir à tragédia da alma persa e renová-la, que Howard se irá juntar a Fazel no cerco a Tabriz e acabar por morrer.
O despertar do Oriente consistirá sobretudo no despertar da razão e na sua libertação face à religião, ao obscurantismo, ao fanatismo, e à tirania que restringem a liberdade individual.
Segundo Kant, não se pode conhecer outra forma de fé que não seja a fé racional, a fé prática, que reconhece apenas a possibilidade do supra sensível unicamente enquanto tal possibilidade reforça a acção moral do homem. Transformar essa possibilidade numa afirmação dogmática significa tornar impossível ao homem, não só a vida teórica e moral, mas a própria religião que se converte em superstição.

Na narrativa, as vozes da libertação são várias: Omar Khayyam, no sec.XI, e muitos outros, já nos sécs. XIX/XX, tais como Djamaleddine («…nas terras do Islão, não há um único recanto onde eu possa viver ao abrigo da tirania.»),Fazel,
Mirza Reza («nos seus olhos podia ler-se toda a aflição do Oriente»), os filhos de Adão, Baskerville, Lesage e Chirine que escreve, numa das suas cartas: «A Pérsia está doente. Tem vários médicos à sua cabeceira, modernos, tradicionais, cada qual propõe os seus remédios, o futuro pertencerá àquele que obtiver a cura. Se esta revolução trinfar, os mulás deverão transformar-se em democratas; se ela falhar, os democratas deverão transformar-se em mulás.».
A centralização islâmica da vida política, com a consequente não separação do poder político e religioso é uma das causas (e simultaneamente consequência) da não libertação da razão. No livro, as vozes resistentes à revolução questionam: «Por que motivo precisamos de uma Constituição, se temos o Alcorão?»
Da mesma forma que, na narrativa, a democracia nascente acaba por sucumbir, também as diferentes tentativas de modernizar o islamismo foram estranguladas pelas lutas das duas super potências, Estados Unidos e União Soviética, durante a Guerra Fria. Para destruir o bloco comunista, os Estados Unidos não hesitaram em se aliar ao que havia de mais ultra conservador e anti iluminista, mais especificamente ao mundo islâmico.
Assim, ao perseguir a destruição do socialismo, as potências capitalistas acabaram por alimentar o terrorismo que neste início de século busca o fim do Ocidente.
Portanto, esta frase é premonitória e nos dias de hoje verificamos como as convulsões que se vivem no Oriente afectam a vida do Ocidente, com constantes ataques terroristas e a chegada de vagas de refugiados que diariamente procuram a segurança no Velho Continente que não consegue (ou não quer) dar resposta a esses movimentos migratórios.

Mas, se por um lado, o Ocidente sofre também com essas convulsões, por outro lado é o próprio Ocidente, com os seus interesses político-economicistas (fundamentalmente petrolíferos, geoestratégicos, venda de armas…) que continua a alimentar essa instabilidade e a fomentar o fundamentalismo islâmico. Este consolidou-se como ideologia dominante nas últimas décadas do séc. XX, principalmente após a revolução Iraniana de 1979, a ascensão dos Talibãs ao poder no Afeganistão e ainda a proclamação do Estado de Israel na Palestina em 1949.


Samarcanda
 Amin Maalouf
 por Maria José Marques
“Tinha curiosidade de ver o que restava da cidade onde desabrochara a juventude de Khayyam.” (p.313) Eis o que leva Benjamin Omar Lesage a Samarcanda. Dos tempos antigos só encontra ruinas. “Em redor do Reghistan erguem-se três monumentos, três gigantescos conjuntos, torres, cúpulas, pórticos, altos muros todos ornados de mosaicos minuciosos, de arabescos com reflexos de ouro, de ametista, de turquesa. E de laboriosas escritas. (…) corroídas pelo tempo, pelo vento, por séculos de indiferença.”  “Sobre a época que o apaixona não recolherá senão lendas, histórias de djins e de divs “
Numa época em que o orientalismo era moda, Théophile Gautier saudava nas quadras de Omar Kéyam, divulgadas em traduções de um reduzido número de quadras    “esta absoluta liberdade de espírito que os mais ousados pensadores modernos mal igualam.” Ernest Renan, escritor, filósofo, teólogo, historiador, reforçava a ideia que “Khayyam talvez seja o homem mais curioso de estudar para compreender aquilo em que pode transformar-se o livre génio da Pérsia no espartilho do dogmatismo muçulmano”
Fadado com o « middle name » Omar em homenagem ao poeta que uniu seus pais, Benjamin O. Lesage procura com afinco o Manuscrito de Samarcanda , o original, o verdadeiro que se perdera no tumulto dos séculos, na miragem de nele descobrir o poeta. E encontra ! Tal como nas histórias das mil e uma noites, passadas muitas aventuras, superadas enormes dificuldades graças a nobres e úteis ligações de amizade além das auspiciosas coincidências do destino, compensadas muitas das suas virtudes, Benjamin encontra o Manuscrito na posse da bela, rica e destemida princesa Chirine disposta a partilhar não só o precioso livro mas também a sua vida.
            Shirin , filme realizado por Abbas Kiorostami -2008
Exibe 114 actrizes espectadoras mudas e comovidas do poema persa Khosrow e Shirin  lido / dito em off .

Verão de 1072, o incomparável Omar, filho de Ibraim Khayyam de Nichapur, admirador e estudioso de Avicena, é levado à presença do cádi de Samarcanda depois de ter um mau encontro com rufias que maltratam um velho e o acusam de ser alquimista. O juiz Abu Taher reconhece Omar pela sua ciência mas não deixa de pôr à prova o seu zelo religioso e de lhe dar alguns conselhos para que domine os seus impulsos . É das mãos desse juiz que Omar recebe o livro “duzentas e cinquenta e seis páginas virgens, ainda sem poemas, nem pinturas, nem comentários à margem, nem iluminuras.” (p.25.Os tempos são de “ segredo e medo (…) Sempre que um verso tomar forma no teu espírito, se abeirar dos teus lábios, tentar sair, recalca-o sem rodeios, escreve-o antes nestas folhas, que ficarão em segredo.”(p.25) Aconselhou o cádi.
            Dos poderosos Omar recusa honrarias e riquezas como recompensa do seu talento, basta-lhe (p.88)” o suficiente para beber e comer, alojar-me e vestir-me.”  Pede antes um observatório e instrumentos para medir a duração exacta do ano solar. Durante sete anos Omar trabalha no observatório de Ispaão, institui o novo calendário em 1079 e deleita-se com um bom vinho na companhia de Djahne : “ a felicidade a emboscar-se na monotonia”. O vizir considera-o “ discreto, sensato, justo equitativo” ,o perfil ideal para ser o chefe dos espiões. Khayyan escusa-se do cargo e sugere em boa fé o nome de Hassan Sabbah. Abriu a porta ao terror pela vigilância, controlo e intolerância religiosa da Seita dos Assassinos. Quando os melhores, os puros, não estão disponíveis para servir ...

             A deleitosa Pérsia dos fragrantes pomares e jardins, dos tapetes, sedas e brocados dos palácios imponentes, do Chiraz inebriante, do vento que acaricia, do alaúde tangido com amor e arte perder-se-á nos tumultos insensatos dos ambiciosos, as bibliotecas, ai as bibliotecas, de tão ameaçadoras e perigosas são imoladas pelo fogo. Restam os livros salvos por milagre, as ruínas, as lendas, os mitos.
Alguns robai de Khayyam surgem onde menos se espera: Abbas Kiarostami, realizador iraniano, usa poesia persa nos diálogos, títulos e temas dos seus filmes. No filme “ The wind will carry us” o realizador e o médico atravessam de mota uma seara e em resposta ao comentário de que o outro mundo é melhor que este recitam um robai de Omar Khayyam
They promise of houries in heaven
But I would say wine is better
Take the present to the promises
A drum sounds melodious from distance.

O Sabor da Cereja ” de Kiarostami é uma meditação sobre a condição humana a propósito da história de um homem de meia idade que deseja por termo à vida.

            “Gabbeh” do realizador Mohsen Makhmalbaf  é uma deliciosa fábula contada por um tapete persa que um casal de velhotes vai lavar num riacho.

“Kandahar” filme dirigido por Mohsen Makhmalbaf, conta a história de uma jornalista refugiada no Canada que procura irmã que ficou no Afeganistão durante a guerra civil Taliban .

“ O Quadro Negro” filme dirigido por Samira Makhmalbaf, conta as dificuldades que enfrentam professores itinerantes que carregam um quadro negro procurando alunos durante a guerra Irão- Iraque.

“Separação” de Asghar Farhadi.Um casal enfrenta um processo de separação no Irão actual. O marido não quer deixar Teerão, a mulher quer procurar no estrangeiro uma vida melhor para si e para a sua filha pequena.

Nestes filmes está a minha visão do Irão.
           
Clube de leitura, 9 de Abril de 2018
Maria José Marques

A história da Pérsia/Irão do século XX

por Jorge Paradinha


O Irão, terra dos arianos, Pérsia para os ocidentais, já era conhecido cinco séculos antes de Cristo. Até ao século XX fez história com Ciro, Dario - dono do maior e bem organizado império persa, destruido mais tarde por Alexandre o Grande, rei da Macedónia - com os partos, romanos, árabes, turcos, mongóis e também com os portugueses, com a conquista do reino de Ormuz por Afonso de Albuquerque. No século XVI os safávidas, fundadores de novo Império, forjaram o Irão moderno seguidor do xiismo, apoiantes de Ali, quarto califa ou “santo”para os xiitas, o verdadeiro sucessor do profeta Maomé, tornando-o o maior país xiita do mundo, posição que ainda ocupa.

No século XX começou a jorrar o petróleo nas areias do deserto, explorado por companhias inglesas, anglo-persas e mais tarde também por americanas, ficando a economia do Irão progressivamente dependente da Europa. Após a Primeira Guerra Mundial passa por um período de grande desenvolvimento, com a dinastia Pahlevi, dos Xás, no campo da saúde, educação e infraestruturas, que levou ao aparecimento de uma sociedade industrializada, aberta ao ocidente, com uma classe média profissional e operariado industrial. Os reinados fortemente ditatoriais dos Xás e a exploração económica pela Inglaterra e EUA, entre outros, conduziram o Irão à revolução de 1979, liderada pelo aiatolá Khomeni, que instalou no país a república islâmica, regime onde a hierarquia religiosa se confunde com o poder político. A partir daqui as convulsões internas e externas sucedem~se em catadupa, com a sangrenta guerra com o Iraque, rompimentos políticos e económicos com o ocidente, com boicotes sucessivos por parte deste e sanções da ONU, muito devido ao programa nuclear que ameaça o seu maior inimigo, Israel. No fundo, o Irão tenta reconquistar o estatuto de potência regional, numa região de maioria árabe e sunita. Na presidência de Obama houve alguma abertura ao ocidente, que está lentamente a arrefecer com a administração Trump.
Os iranianos são um povo culto e hospitaleiro, sujeito a rigorosos códigos sociais. O cabelo e o colo femininos voltaram a ser fonte de pecado, e as jovens preferem ficar solteiras e seguir uma carreira profissional, em vez de casarem e ter de pedir autorização ao marido para a exercer.




Clube de Leitura, 9 de Abril de 2018 – Samarcanda, de Amin Malouf         

 Jorge Paradinha


Omar Khayyam e Ricardo Reis

por António Nabais


Em Samarcanda, Omar Khayyam resume a sua obra da seguinte maneira: “São apenas robaiayt sobre o vinho, sobre a beleza da vida e a sua vacuidade.” (p. 61) Esta definição provoca em Djahane “um grito de incredulidade, quase de desprezo.”. Nessa mesma página, o narrador explica a essência da poesia produzida pelo poeta persa: “Que um sábio… Djahane está intrigada.” Omar declara, ainda, que escreve robaiayt porque, ao contrário da amada, não tem “as ambições de um poeta de corte.”
Omar Khayyam é poeta e cientista, actividades que estão ligadas a um mesmo nome, ao contrário do que acontece, por exemplo, com António Gedeão ou com Miguel Torga. Com o uso do pseudónimo, dir-se-ia que Rómulo de Carvalho e Adolfo Rocha não quiseram misturar a literatura e a vida profissional. Em Kahyyam, tudo se mistura, mas a verdade é que parece ter necessidade de esconder a poesia que escreve, talvez devido a um certo carácter plebeu, por um lado, ou ao facto de os seus textos poderem ser considerados dissolutos e eventualmente heréticos (O que vale mais? Meditar numa taverna, /ou prosternado na mesquita implorar o Céu?/ Não sei se temos um Senhor,/ nem que destino me reservou.)
Kahyyam parece fugir para baixo, com uma poesia em que o vinho e o corpo da amada se misturam, juntando a isso uma obsessão por aproveitar cada momento, o que, em termos genéricos, o coloca do lado do carpe diem Horácio.

Ricardo Reis é um elitista, a sua poesia vai em direcção ao alto, como que fugindo da vida para tornar mais fácil a morte do Outro. Kahyyam não é imune à perda, mas parece mais interessado em aproveitar o momento como uma fuga em direcção ao prazer do vinho e do sexo.
A poesia de Ricardo Reis é aristocrática, de um paganismo artificial. Reis procura viver o momento, é certo, mas em fuga, evitando os sentimentos extremos. Kahyyam não quer desenlaçar as mãos: “Que pobre o coração que não sabe amar/e não conhece o delírio da paixão./Se não amas, que sol pode te aquecer,/ou que lua te consolar?”
Na carta que Pessoa escreveu a Casais Monteiro acerca do fenómeno heteronímico, explicou Reis: “pus em Ricardo Reis toda a minha disciplina mental, vestida da música que lhe é própria”, “É um latinista por educação alheia, e um semi-helenista por educação própria.” “Ricardo Reis, depois de uma deliberação abstracta, que subitamente se concretiza numa ode.” “Reis [escreve] melhor do que eu, mas com um purismo que considero exagerado.”

                Num encontro imaginário entre Kahyyam e Reis, imagino que o primeiro iria impacientar-se com a abulia do segundo: “Você, Reis, quer ficar na margem do rio, cansado de dar a mão a Lídia; eu prefiro arrastar Djahane para a corrente, porque só vale a pena viver no perigo de afogamento.”

Samarcanda- a estrutura do romance

Uma leitura de SAMARCANDA de Amin Maalouf 

por Margarida Mouta

Neste romance, o autor põe em prática a técnica da narrativa em abismo, apresentando-nos, à semelhança do que acontece nas “Mil e uma noites”, várias histórias dentro de uma história, em que se misturam a realidade com a ficção, a transcendência das culturas e das religiões e a figura de “viajante ambulante”. Temos, por um lado, o naufrágio do “Titanic” numa data bem real, a noite de 14 para 15 de abril de 1912 e, por outro lado, o manuscrito de Omar Khayyam, exemplar único dos Robaïyat, as célebres quadras que o poeta e sábio persa escreveu há quase mil anos e que será a mais prestigiada vítima do naufrágio. Dessa catástrofe, em que perderam a vida mais de 1500 pessoas, o narrador pouco falará. Seis anos depois (o que nos permite situar a narrativa em 1918), o que o obsidia é ainda esse ser de “carne e de tinta do qual foi, por momentos, indigno depositário”.
No fundo do Atlântico há um livro. É a sua história que vou contar.” (p.9). Desde este início, anuncia-se o Ocidente (Titanic) entrelaçado com o Oriente (o manuscrito de Khayyam). É perseguindo o manuscrito que o autor nos faz percorrer diferentes tempos e diferentes espaços, expondo o nosso olhar tanto à sabedoria como à loucura dos homens.
Na primeira parte, Omar Khayyam, do alto da sua sabedoria irá, ao sabor do tempo e da sua existência, transformar um livro virgem que lhe havia sido oferecido pelo seu protetor, o juiz Abu Taher, num livro precioso. Na segunda parte, o narrador seguirá a pista de Omar e, numa espécie de caça ao tesouro, vai descobrir a Ásia, uma cultura, costumes, formas de sentir e sensibilidades a que nunca antes fora exposto. 
Os nomes de figuras célebres tanto ocidentais como orientais cruzam-se na obra, num itinerário que engloba duas épocas espaçadas – o século XI e o século XX num vai -vem entre a era de Khayyam e a era do Titanic, apresentadas sob a forma de quatro livros agrupados dois a dois e que contêm o mesmo número de capítulos (24) num total de 48.
O narrador, Benjamim O. Lesage, que está entre os passageiros do Titanic, tinha acabado de se casar com Chirine, uma persa. Ambos embarcam, levando na bagagem o precioso pergaminho. “ – Os Robaïyat no Titanic! A flor do Oriente transportada pelo florão do Ocidente!” E o fim do romance retoma o seu começo: “No fundo do Atlântico há um livro. É a sua história que vou contar.”
E esta história é simultaneamente a história de um livro ( ou de dois livros encaixados um no outro, a história de um homem (ou de dois homens unidos pela escrita) e a história de um lugar (ou de vários lugares do oriente)

SAMARCANDA – a história de um livro ou de dois livros?



O livro, recolha dos Robaïyat de Omar Khaynam começa a ser escrito em 1072 em Samarcanda. Vai perder-se por três vezes antes de reaparecer para voltar a desaparecer mais uma vez. Eis algumas datas segundo um quadro que tomei de empréstimo a um estudo de uma senhora chamado Fatiha Boulafrad da Universidade de Medea na Argélia e que consultei na net.  
1072 – Começa a ser escrito (Samarcanda)
Entre 1116 e 1131 - Desaparece (Merv);
Entre 1116 e 1131 – Aparece (Alamut );
14 de março de 1257 - Desaparece (Alamut)
1891- Aparece (Índia)
1891 - Desaparece (Teerão)
1896- Aparece – (Teerão);
15 de abril de 1912 – Desaparece (Oceano Atlântico)

Samarcanda, Merv, Índia, Teerão, finalmente o Atlântico. A odisseia dos Robaïyat leva-nos a mudar de espaço e de tempo e constitui uma espécie de ciclo de vida em que se inscrevem ao mesmo tempo as marcas da permanência e da progressão, um ciclo que não é alheio à ideia do eterno recomeço, pois o narrador está sempre à espera de uma ressurreição. A história de um livro será então pretexto para o livro.

 SAMARCANDA – a história de um homem ou de dois homens?
O contexto histórico e político é verdadeiro, a maior parte das personagens tiveram uma existência própria. Como exceção, surgem meia dúzia de figuras, entre as quais se destacam as figuras femininas, Djahane e Chirine (necessárias ao desenho da intriga amorosas) e a figura masculina de Benjamim O. Lesage, narrador fictício, mas credível, porquanto se sabe, de fonte segura, que um exemplar dos Robaïyat viajava mesmo a bordo do transatlântico

         

PERSONAGENS DE FICÇÃO
PERSONAGENS HISTÓRICAS
Livro Primeiro
Poetas e Amantes
Cap. 1 a 14
e  Livro Segundo
O Paraíso dos Assassinos
Cap. 15 a 24

O estudante da cicatriz, o Juiz Abu Taher, Djahane, Vartan,
Khayyam, Tughrul Beg, Tchagri Beg, Alp Arslan, Hassan Sabbah, Nasr Khan, Nizamel-Molk, Malikshah, Khatoun, Ahmed Khan, Gengis Khan, Hulagu Tamerlan.
Livro Terceiro
O Fim do milénio
Cap. 25 a 35
e Livro Quarto
Um poeta ao mar
Cap. 36 a 48

O narrador, Fazel, Chirine, Baskerville, o pastor, Panoff.
Renan, FitzGerald, Manet, Rochefort, Mirza Reza Djamaleddine, o sultão Abdel-Hamid, Nassereddine Shah, Morgan Shuster, Knox d’Arcy, o Xá de 11 anos, V. Hugo, Churchill, G. Clemenceau, Lorde Salisbury, W. Blunt, T. Gautier, MacKinely, Nicolau II, Leopoldo II, W. Taft, Boulanger, Naus.

Das histórias que se interligam dentro da história, distinguem-se, sem dúvida a história de Omar Khayyam e de Benjamin Lesage, no fundo as únicas que interessam verdadeiramente, tendo em conta as relações que ambos mantêm com o manuscrito. Benjamim narra a história do livro, Omar é o seu autor. Unidos pelo mesmo nome (Omar), ambos vão percorrer a Pérsia para não serem assassinados. Uma vez a salvo, ambos perdem o melhor amigo e a mulher que amam. Ambos escrevem. E entre o que escreve e o que narra cria-se uma simbiose que dará origem ao romance.
 SAMARCANDA – a história de um lugar / vários lugares
O romance não se limita à narrativa de uma vida ou de várias vidas. É ele próprio um lugar em que se cruzam muitos lugares. É a história da Pérsia reconstituída a partir das histórias das personagens e do manuscrito. A história dos Robaiyat constitui, na realidade, o fio condutor, o elo que liga as histórias umas às outras e a busca do manuscrito não é mais do que pretexto para Amin Maloouf, por interposta pessoa, nos contar a história do Oriente.

Samarcanda é pois uma história cheia de histórias que nos conta a História. 



Samarcanda