domingo, 13 de março de 2011

Retrato de Aline Gauguin




Onde estaria aquele retrato que fizeras dela, em 1888, consultando a tua memória e aquela única fotografia da tua mãe que conservavas encafuada no baú dos trastes? Nunca se vendera, que soubesses. Tê-lo-ia Mette em Copenhague? Devias perguntar-lho, na próxima carta. Estaria entre as telas em poder de Daniel, do bom Schuff? Pedir-lhes-ias que to enviassem. Recordava-lo com cópia de pormenores: um fundo amarelo um tanto ou quanto verdoso, como o dos ícones russos, cor que realçava os formosos e longos cabelos negros de Aline Gauguin. Caíam-lhe até aos ombros numa curva graciosa e apertava-os na nuca com uma fita violeta, disposta em forma de flor japonesa. Uns verdadeiros cabelos de andaluza, Paul. Trabalhaste muito para que os seus olhos aparecessem como os lembravas: grandes, negros, curiosos, um pouco tímidos e bastante tristes. A sua pele muito branca animava-se nas faces com o rubor que nelas assomava quando alguém lhe dirigia a palavra ou quando entrava numa sala onde havia gente que não conhecia. A timidez e a discreta fortaleza eram os traços marcantes da sua personalidade, aquela capacidade para sofrer em silêncio sem protestar, aquele estoicismo que tanto indignava - ela própria to contava- Flora, Madame -La- Colère. Estavas certíssimo de que aquele Retrato de Aline Gauguin mostrava tudo isso e trazia à superfície a tragédia prolongada que fora a vida da tua mãe.


                                 O Paraíso na Outra Esquina

                                                          Vargas Llosa 

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