Os Enamoramentos
Javier Marías
Por Ana Teixeira
A
problemática da eutanásia não é um tema central no livro “Os enamoramentos” de
Javier Marías. Foi todavia a parte que mais me impressionou embora me
tenha tocado profundamente a forma como o autor explora os temas do amor, enamoramento e o seu
contrário, a amizade e o seu oposto, a morte, a moralidade e a metafísica
através , essencialmente dos pensamentos da personagem María Dolz.
A questão da
eutanásia não é diretamente abordada. Não há uma discussão explícita sobre a
possibilidade de utilizá-la como uma opção para a personagem Miguel e Javier
Marías não explora a complexidade deste tema nem as contradições que do mesmo
decorre. Preferiu ir para a banalidade do mal ao por
Ao longo da
narrativa, Javier Marias explora o tema da morte, o reflexo da mesma na vida
dos que sobrevivem , o amor e o destino numa abordagem filosófica e
existencial. O autor questiona as motivações e os limites das relações humanas,
mas não entra especificamente no campo da eutanásia ou aborda a escolha do
personagem Miguel.
Apesar da
eutanásia me parecer surgir no livro como um acto de liberdade que deve ser
concedida a cada um, não se podendo impedir alguém, que está em grande
sofrimento, de exercer o seu direito de escolha e, no caso presente, de escolha
da morte. Contudo, essa mesma escolha não foi explorada pelo autor que em
outras áreas dos sentimentos humanos explorou de forma intensa e filosófica.
A mim
pareceu-me que associou esta autonomia e liberdade humana não ao medo mas aos
reflexos que a mesma teria na sua família em especial na mulher Luísa. Assim
levantou o problema de esta autonomia podendo ser garantida a cada um esteja
ela própria também condicionada pela comunidade próxima condicionando e podendo
impedir alguém, que está em grande sofrimento, de exercer o seu direito de
escolha da morte.
Cada um de
nós, com efeito, não somos individualidades que coexistem na total indiferença
relativamente às opções dos outros com que nos relacionamos e amamos, mesmo
quando o sofrimento se sobrepõe a qualquer outro sentimento.
A Eutanásia
foi aprovada em Espanha em 18 de
março de 2021, para entrara em vigor em 25 de Junho desse ano. Desde essa data
até ao momento actual já praticaram a Eutanásia em Espanha 180 pessoas.
A Espanha
foi o quarto país europeu a descriminalizar a eutanásia, depois de Países
Baixos, Bélgica e Luxemburgo. Em Portugal a lei que descriminaliza a eutanásia
foi promulgada em 16 de Maio deste ano.
Ana Teixeira
Pedaço do meu sofrimento
por Elsa Viegas
Muito me custou iniciar este pequeno texto sobre Os Enamoramentos,
romance de Javier Marias com 1ª edição em português em Outubro de
2012 altura em que o li pela 1ª vez não tendo então ficado deveras
impressionada.
No entanto, um dos temas da recente leitura que me suscitou alguma
curiosidade inicia se com um diálogo, a sós, entre Diaz Varela e a
narradora Maria Dolz; nele, Diaz Varela reflecte em voz alta sobre a ideia
dos sentimentos e comportamentos mesquinhos e egoístas do ser
humano que frequentemente surdem perante o objecto de cobiça; Diaz
Varela tenta aí menorizar o seu próprio comportamento; integrando-o
num comportamento mais vasto do ser humano e contando a propósito o
conteúdo do romance de Balzac, O Coronel Chabert.
Neste romance são descritos os sentimentos da viúva do Coronel, Mme
Chabert, no período da sua viuvez; sentimentos de tristeza mágoa e
solidão pela perda do marido julgado morto, e, paradoxalmente, o
aparecimento de sentimentos de desgosto, ansiedade e receio quando o
marido, em tempos amado, regressa. Esta incómoda e inesperada
situação acarretaria como consequência a reviravolta na actual vida
familiar e financeira/social da antiga Mme Chabert. Agora, Mme. Ferraud
não pretende voltar a um passado tanto tempo outrora ansiado.
Neste diálogo, Diaz Varela pretende mostrar a Maria Dolz que os
sentimentos humanos são perecíveis e mudam consoante as
circunstâncias de vida. Questiona- se se o amor de Luísa renasceria pelo
seu marido mas, perante o velado receio da possibilidade do regresso do
seu amigo morto, tranquiliza se com “a evidência de que os mortos não
devem regressar porque os vivos já não os querem”.
“Há que matar bem os mortos”, dizia Ortega e Gasset.
Elsa Viegas
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