Domínio Público, romance de Paulo Castilho publicado em 2011, foi a obra escolhida para a sessão do Clube de Leitura de 16 de Julho de 2013
Este romance, passado na Lisboa da actualidade, foi distinguido com o Prémio Fernando Namora em 2012.
E porque Verba volant, scripta manent,
foram estas as propostas para os trabalhos escritos a realizar previamente à sessão:
- "Conselho de amigo: torna os teus livros mais escuros e difíceis de compreender, mais vagos, dizes o mesmo mas de maneira que não se perceba bem e vais ver, o teu estatuto aumenta logo." (Cap. II, p25)
- "Foi à Dâmaso Salcede. De atracão. Agora também as mulheres. É o progresso do século XXI." (Cap. XXV, p.292)
- "... o segredo de uma boa relação não é a verdade, nem a sinceridade, nem a bondade, nenhuma dessas coisas piedosas que proclamam as criaturas de boa vontade. É mais simples, é as pessoas terem espaço." (Cap. XIII, p.143)
- : "Também eu li muito quando era jovem, mas agora já não tenho disponibilidade _ disse o Jerónimo virado para a estante_ houveram anos em que cheguei a ler dez livros, principalmente filosofia." (Cap. XXVIII, p.340)
- "Mas hoje em dia como é que um filósofo ganha a vida? Onde é o balcão para levantar o subsídio? E como é que prova que não é o Paulo Coelho? (Cap.XII, p. 139)
- :"Com as mãos pegajosas, a boca cheia, o açúcar a escorregar-lhe pelos lábios, a Rita virou-se para mim: isto é que me reconcilia com a vida. Acenei com a cabeça: estive na Irlanda, país lindíssimo, bolos péssimos." (Cap. XXXII, p. 402)
- "As coisas são como são e as pessoas são humanas e as pessoas-sogras têm uma maneira muito mais humana ainda de serem humanas, sobretudo quando o descendente é do sexo masculino, não me perguntem porquê, não fui eu que fiz as regras, sei apenas que é assim." (Cap.VIII, p.88).
- :"Perguntei à Zu: e agora tens alguém? Conheces os meus princípios_ respondeu a Zu_ exclusivo faz-me nervoso, na minha idade preciso de sossego e conforto e por isso enveredei pelo sistema da especialização" (Cap. XX, p.234)
- :"...chop stocks? pump and dump? o que é isso?" (Cap.VIII, p. 96)
- : "Acoitada atrás da grelha metálica, a velha saudou-me com os impropérios do costume: larga o rapaz, gabirua, não te chegam os meninos pipis?" (Cap. XXVII, p.329)
propostas apresentadas por
Alexandra Chop Stock
Domínio
Público, Paulo Castilho
Clube de Leitura – Julho
2013
A
necessidade de espaço
por Manuela Pereira
O segredo de uma boa
relação não é a verdade, nem a sinceridade, nem a bondade, nenhuma dessas
coisas piedosas que proclamam as
criaturas de boa vontade. É mais simples, é as pessoas terem espaço. (p.143)
“...Abateu-se sobre nós uma
ligeira claustrofobia – Peter a mais, Rita a mais, tudo a ficar um pouco visto,
feito, repetido.”
A Rita precisa de espaço para
não deixar de ser a Rita. Um espaço livre como a sua casa, não um apartamento
espectacular com vida programada “...num sítio sem alma a olhar para o Mar da
Palha.”
Talvez as más razões a tenham
levado à decisão certa. Com a fuga para a frente procura uma nova ligação, que
não a transforme numa pessoa triste e cheia de ressentimentos.
Em Domíno Público as
personagens saltam fora deste processo de anulação, criando outras ligações
diferentes, criando espaço, outras polaridades, que possam impedir o choque ou
a fusão.
A excepção é a relação entre
Teresa Alves e o Dr. João Alves. Casaram na igreja, “...foram católicos
progressistas, mas hoje já não são nada que tenha nome...”. Dizem que levam a
sério as suas obrigações perante Deus e os homens, “...mas nunca notei que
fossem melhores ou piores que nós mortais vulgares de Lineu.”
O casamento é outra história,
não tem nada a ver com o amor. No casamento “...até o meu pai saiu ao lado da
minha mãe. É o destino dos maridos.”
“O Eduardo e a Sara são muito
complementares – disse a Sofia – o Eduardo gasta o dinheiro do meu pai, a Sara
gasta-lhe todo o dinheiro que sobra...” Uma relação de interesse também não tem
nada a ver com o amor.
A Zu e o Tiago são demasiado diferentes e
por isso incompatíveis. Não há ligação possível entre eles apesar da filha
comum, Benedita. Tiago diz, à beira de lágrimas de raiva, “Não gosto dela, foi
uma emboscada, a mulher é um génio, sou fraco, sou idiota, deixo-me ir.”
A atracção entre pólos opostos
cria uma corrente de dependência mútua, ou total. A colisão
violenta e a fusão de núcleos do mesmo sinal, liberta
uma enorme quantidade de energia.
A relação de Sofia e Jerónimo
Silveira é violenta: “...fazemos as pazes, aceitamos ambos que acabou e fazemos
as pazes, ficamos amigos, e tudo o resto – violações, queixas, polícia – é
patético, só pode dar para rir.”. “A natureza é que sabe. Não há (havia) cá
desequilíbrios.”
Filomena, a “viúva” de Bruno,
amigo do Vasco, oscila entre Valentim e JC (Joaquim Casaca). “Olhando para o
espelho a coisa complica-se. Está lá uma cara. Dizem-me que é a minha cara.
Dizem mais, dizem que sou eu. E isso eu não sinto, acho mesmo que não.”
“É tudo desequilíbrio hormonal,
mulheres é assim, um turbilhão de produtos químicos a circular naqueles
corpinhos...”
“O Póvoa disse-me um dia que o
verdadeiro romance hoje em dia acabou porque não há obstáculos. Não custa. Não
é difícil. Ninguém acha que tenha de merecer o amor.”
La gran virtù d'Amore e 'l bel piacire
che nel mio cor di voi,
mia donna, è nato
m'ha fedelmente in vo', donna, tornato,
ch'i v'amo e voglio sempre vo' servire
Dante
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