De repente, fora, houve um rebuliço, e vozes sobressaltadas gritando: «Ordem!» Uma senhora, que atravessava com um pequenito, fugiu para dentro do bufete, enfiada. Um polícia passou, correndo.
Era uma desordem!
(...)
Carlos achou-se ao pé do marquês, que exclamava, pálido:
- Isto é incrível! Isto é incrível!
Carlos, pelo contrário, achava pitoresco.
- Qual pitoresco, homem! É uma vergonha, com todos esses estrangeiros!
No entanto, a massa de gente dispersava, lentamente, obedecendo ao oficial da Guarda, um moço pequenino mas decidido, que, em bicos de pés, aconselhava para os lados, numa voz de orador, «cavalheirismo» e «prudência»... O jóquei de paletó alvadio afastou-se, apoiado ao braço de um amigo, coxeando, com o nariz a pingar sangue: e o comissário desceu para a pista, com um cortejo atrás, triunfante, sem colarinho, arranjando o chapéu achatado numa pasta. A música tocava a marcha do «Profeta», enquanto o desgraçado juiz das corridas, o Mendonça, encostado à tribuna real, com os braços caídos, aparvalhado, balbuciava num resto de assombro:
- Isto só a mim! Isto só a mim!
O »Profeta» é uma ópera em cinco actos de Giacomo Meyerbeer com libreto de Eugène Scribe que estreou em 1849, em Paris, tendo conhecido logo um enorme sucesso. À escolha de um excerto desta ópera não terá sido alheio o enredo, cheio de batalhas e grandes cenas de massas, cenas majestosas que representavam a luta por grandes ideais. Mais uma vez, o cinismo implacável de Eça a sublinhar a alma nacional que quer ser civilizada e cosmopolita, mas não passa de arruaceira e pífia, irremediavelmente provinciana, afinal.
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